Na Freguesia de Benquerença (Penamacor) realiza-se anualmente a romaria de Nossa Senhora da Quebrada, cuja capela se situa numa colina (das várias existentes no local) na margem direita da Ribeira da Meimoa. Na banda oposta àquela em que se situa a localidade. É de cerca de três quilómetros a distância que separa a aldeia da ermida. Estamos a falar, sensivelmente, de meio caminho entre a sede da freguesia e as Quintas do Anascer.
O dia da celebração da festa era tradicionalmente na quinta-feira da ascensão, contudo, sabendo-se das dificuldades de muitos pregrinos em estar presentes nesse dia, optou-se por transferi-la para o domingo seguinte. Os pontos altos das celebrações religiosas são a missa campal de domingo seguida de procissão e a missa nocturna seguida de procissão das velas que ocorrem no sábado da véspera.
Paralelamente, ou melhor, antes e sobretudo depois das celebrações religiosas, há também lugar para as festividades civis, sendo de realçar os petiscos onde tem lugar de destaque o ensopado de borrego (que muitos teimam agora em apelidar, quanto a mim improriamente, de "chanfana" (termo que não faz parte da nossa tradição), as febras, o frango ... tudo isto antecedido de uma boa malga de caldo das couves! Claro que o tinto é também de presença obrigatória, sendo certo que agora o pessoal tem que tomar as necessárias precauções, não vá o diabo tecê-las, já que, longe vão os tempos (ou talvez não) em que as viaturas eram de tracção animal. Então toleravam-se melhor os excessos, visto que as bestas eram abstémias e sabiam quase sempre o caminho de regresso. Nutrindo grande estima pelos seus donos, que nestes dias até lhes reforçavam a ração, levavam-nos, em contrapartida, sãos e salvos de volta ao aconchego do lar!
Sim tem toda a razão, nada melhor para digerir o almoço que uns passos de dança ao som da Banda de Aldeia de João Pires ou de um conjunto moderno. Caro leitor temos que concordar que a tradição já não é bem o que era, jà não há o balho abrilhantado pela concertina do Fanotcha, do Alziro Galante da Orca, ou do Luís Ceguito! Lembra-se que havia sempre uma cervejita debaixo da cadeira em que o tocador se instalava, que servia para lhe dar alento e retemperar energias depois do esforço dispendido ao fim de cada moda executada!
Sobre tradição não seria justo se não registasse aqui a excepção que é a centenária e sempre renovada Banda de Aldeia de João Pires! São uns valentes, o tempo passa e a Banda continua, cada vez com mais pujança e juventude!
O local é de incomparável beleza e são indescritíveis as panorâmicas que dele se avistam : a Serra de Santa Marta, o casario da nossa aldeia, o verdejante vale da ribeira, a Serra da Estrela, a Serra da Opa, eu sei lá que mais... O peregrino sente-se aqui mais próximo do Paraíso! Pressentem-se poderosas forças positivas, que nos levam, pelo menos temporariamente, a esquecer o nosso egocentrismo e a partilhar com os outros as alegrias e as tristezas, os êxitos e os fracassos, os bons e os maus momentos! Formulam-se pedidos, fazem-se agradecimentos, pagam-se promessas à Virgem que a todos abriga sob o seu manto protector!
Meu Deus é avassaladora a torrente de imagens, de recordações que neste momento teimam em preencher a minha mente: a nossa burra que a poucos consentia que a montassem, levantava as patas dianteiras e, apoiando-se apenas nas traseiras, despojava-se em segundos da indesejada carga; ir à comida para as vacas (a marela, a borisca, a formosa), levá-las a pastar e depois à ribeira para sassiarem a sede; as cavalgadas na nossa égua; tocar a burra ou a vaca na nora, na volta da ribeira, na tapada do Henrique, ou na alverca; a cabra preta, que andava atrás de nós pelos caminhos fazendo de quando em vez umas lateralizações, sempre que avistava alguns pés de milho, alguma estaca de oliveira com rebentos novos ou outros manjares a que não resistia, recuperando rapidamente o atraso com uma enérgica corrida .... Tem razão, caro leitor, isto já não tem que ver com a Senhora da Quebrada, ... ou, se calhar, até talvez tenha!
Se conseguiu ler estas deambulações do meu imaginário (e de tantos outros benqueridos, estou certo) fico-lhe muito grato e gabo-lhe a paciência.
É minha convicção que nos voltaremos a encontrar, quem sabe na Senhora da Quebrada ou então, porque não, na Senhora das Neves.
Até lá.
Jogilbo
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